"Nunca conheci quem tivesse levado porrada
Todos os meus conhecidos têm sido campeões em tudo
E eu, tantas vezes reles, tantas vezes porco, tantas vezes vil
( ... )
Que tenho sido grotesco, mesquinho submisso e arrogante
Que tenho sofrido enxovalhos e calado
Que quando não tenho calado, tenho sido mais ridículo ainda
( ... )
Eu, que tenho sofrido a angústia das pequenas coisas ridículas
Eu verifico que não tenho par nisto tudo neste mundo
Toda gente que eu conheço e que fala comigo
Nunca teve um ato ridículo, nunca sofreu enxovalho
Nunca foi senão príncipe - todos eles príncipes - na vida...
Quem me dera oivir de alguém a voz humana
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
( ... )"
.
Tenho me sentido uma árvore no outono, desfolhada, aparentemente estéril, desnuda, descolorida... Já o solo à minha volta, ao contrário, é especialmente belo, carregado de uma multiplicidade estonteante de cores. Esta metáfora me veio à cabeça estes dias, ao pensar em perfeição. .
O homem vive em busca da perfeição. (?) Pode haver ato mais doloroso e prazeroso? É algo tão paradoxal esta busca do impossível.
Gosto da imperfeição, como uma parte do todo que somos, perdê-la implicaria em não termos mais porque buscarmos a superação.
Ser imperfeito é a razão, o motivo, a justificativa. Ser imperfeito é bom, nos faz sentir gente, pois gente é o que somos e não deuses como tolamente pretendemos. Talvez sejamos, como aqueles do Olimpo, cheios de imperfeições, mas de qualquer forma não somos imortais, nem temos superpoderes. Somos gulosos, egoístas, agressivos, invejosos, presunçosos, apegados, indiferentes, pudicos, críticos, avarentos, hipócritas, exigentes, mesquinhos, arrogantes, covardes, ridículos, limitados, soberbos...
Sentiu-se ofendido? Perdão.
Jura que não se viu em nenhuma destas palavras? Desculpem se não creio numa negativa, assim como PESSOA no poema transcrito, não acredito em perfeição. .
(Sarah K > junho/2007)